A Bumba-Relógio

16/06/2010 20:06

 

Por Rogério Rocco ANALISTA AMBIENTAL

Com a calamidade das chuvas registrada no mês de abril, passou praticamente despercebido o Dia Mundial da Terra, 22 de abril, cuja intenção da declaração é a de fortalecer os processos de proteção do planeta, que é a nossa casa ampliada. É um incentivo para que comecemos a mudar os hábitos que contribuem com a deterioração das condições ambientais da Terra.

Mas como acreditar em novos hábitos, quando assistimos diariamente à reprodução de comportamentos que nos conduzem mais a dias de terra arrasada? As chuvas que atingiram o estado do Rio de Janeiro no mês passado foram tão fortes que rasgaram o solo, deixando expostas as feridas causadas pelas destrutivas gestões públicas nas cidades. E o exemplo mais revelador ocorreu em Niterói: uma comunidade inteira foi arrastada com suas casas construídas em cima de um antigo lixão, tornando o município campeão na maratona das mortes em todo o estado.

O Morro do Bumba, onde ocorreu a tragédia, tinha uma verdadeira bumba-relógio armada pela omissão de seguidos governos que passaram pela cidade nos últimos 30 anos. Governos que preferem encobrir as sujeiras que fazem, com a certeza de que quando forem descobertas já será tarde demais para encontrar culpados e (ir)responsáveis.Onde serão enterrados os resíduos de uma economia mundial que aposta na produção intensiva de garrafas pet, de equipamentos de curta durabilidade (celulares, pilhas, baterias, eletroeletrônicos) e de supérfluos que não se prestam a nada? Onde estarão localizadas as bumbas-atômicas, que serão os aterros de lixo nuclear das centenas de usinas espalhadas pelo mundo, que duram milhões de anos com seu poder destrutivo?Os dirigentes de nosso planeta não têm respostas a essas perguntas, como ficou comprovado na Conferência de Copenhague, realizada em dezembro passado, quando os chefes de Estado não chegaram a nenhum acordo, senão o de adiar a discussão para mais à frente. Enquanto isso, o lixo vai se acumulando.

Parece falta de planejamento.

E, de fato, é. Mas não à toa.

É que as administrações públicas estão mais comprometidas com o atendimento dos interesses econômicos em seus territórios do que propriamente com políticas socioambientais, que assegurem condições dignas de vida para as atuais e futuras gerações. E todos os indícios apontam para um agravamento dos efeitos das mudanças climáticas sobre a vida dos bilhões de pessoas que habitam a Terra.

O planeta está parecendo um ônibus desgovernado, com uma população de passageiros.

O momento é para mudanças profundas e paradigmáticas na gestão pública, para as quais não se dispõe grande parte das atuais classes dirigentes. Portanto, pressupondo que há vida inteligente na sociedade, essa responsabilidade pelas mudanças recai sobre cada um de nós, individual e coletivamente.

Somente uma reação organizada de toda a sociedade poderá promover processos que possam realmente homenagear a Mãe Terra e permitir que as chuvas, de qualquer mês, voltem tão somente a fechar as estações como poetizou Tom Jobim em Águas de março.

 

Fonte: JB Online.

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